Supremo mantém suspensa obra da Ferrogrão e envia caso para conciliação

Indígenas Kayapó continuam a luta em defesa da floresta e da vida
Supremo mantém suspensa obra da Ferrogrão e envia caso para conciliação
07.06

O ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, na ADI 6553, manteve suspenso o projeto da Ferrogrão e enviou o caso para discussão no órgão que trata de conciliação judicial (chamado Centro de Soluções Alternativas de Litígios). A decisão foi tomada em 1º de junho, quando mais de 40 lideranças Kayapó estavam em Brasília (DF) para marcar posição contra propostas que ameaçam a floresta e o modo de vida dos povos indígenas.  

Demanda antiga do agronegócio, o projeto da ferrovia está parado porque o governo decidiu reduzir uma área de conservação, o Parque Nacional do Jamanxim – a ser cortado pelo atual traçado da Ferrogrão –, por Medida Provisória, e não por projeto de lei, o que fere a Constituição e a legislação ambiental. Serão 993 km de ferrovia de carga entre Sinop e o porto de Miritituba, no sul do Pará, com trechos passando próximo a Terras Indígenas.

Além disso, nunca houve as devidas consultas legais aos indígenas que vivem na região e previsão das compensações ambientais. Passou batida a questão da consulta prévia, livre e informada, garantida pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil em 2003. O projeto atual inclui apenas uma consulta póstuma, na fase de licenciamento, e não prévia garantida na Convenção.

A ferrovia, com custo estimado de R$ 10 bilhões, visa escoar a produção de soja e milho de uma das principais regiões produtoras, o Mato Grosso (MT), para os portos do norte do Pará, de onde são exportados, acompanhando o traçado da BR-163, que, para os Kayapó, trouxe desmatamento, garimpeiros, madeireiros e pistoleiros.

“Somos guardiões da floresta e queremos que ela fique para as próximas gerações. Não somos contra o desenvolvimento, mas defendemos que ele seja sustentável e que os indígenas tenham voz nessas discussões”, diz o presidente do Instituto Kabu, Doto Takak Ire, que acompanhou em Brasília as decisões.

O Supremo havia marcado o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6553, que questiona a alteração dos limites do Parque do Jamanxim para o dia 30 de maio, mas acabou não acontecendo. 

“A cada etapa desta disputa vai ficando mais evidente que projetos de infraestrutura na região amazônica e que afetam os povos indígenas devem obedecer a um rigoroso escrutínio socioambiental com um profundo respeito aos povos indígenas e às comunidades do Pará. Sem isso, não haverá nenhum tipo de obra”, afirma Melillo Dinis, um dos advogados da ADI 6553 e do Instituto Kabu.

Com a decisão do ministro Alexandre de Moraes de pedir estudos mais aprofundados sobre a construção da ferrovia, os próximos passos devem incluir discussões com o governo. Agora, os indígenas demandam que os estudos voltem a ser feitos de forma responsável e com compromisso socioambiental.

As lideranças Kayapó das Terras Indígenas Baú e Menkragnoti associadas ao Instituto Kabu e das duas aldeias Panará recém-associadas ficaram satisfeitas com a decisão da justiça, mas esperam agora que a legislação ambiental seja respeitada.

Carta de Sinop – Entre os dias 25 e 26 de maio, representantes e lideranças de 12 povos indígenas, além de organizações e movimentos sociais, se reuniram em Sinop (MT) para discutir impactos de empreendimentos de infraestrutura em seus territórios, incluindo a Ferrogrão.

Kokoró Mekrãgnotire, liderança Kayapó, esteve no encontro e defendeu que os povos indígenas sejam consultados previamente. “Fui representando nossos povos, tanto do território Mekrãgnoti, Panará e Baú. Participei da abertura e disse que a gente quer ser ouvido. O governo precisa consultar nossas lideranças nas aldeias. Sem consulta não pode ter projeto”, resume Kokoró.

Para formalizar os encaminhamentos durante a reunião, foi assinada a “Carta de Sinop”, um documento coordenado pelo Fórum Teles Pires que destaca os riscos ambientais da construção da Ferrogrão – como desmatamento, grilagem e conflitos por terras – e reforça as demandas dos povos, como a realização do processo de consulta prévia às comunidades e  a correção de falhas nos estudos de planejamento da Ferrogrão, incluindo análise de riscos.

Conheça o traçado da Ferrogrão no mapa aqui