Os quatro povos mais afetados pelo garimpo ilegal na Amazônia firmaram uma aliança para lutar contra o garimpo ilegal e tentativas de legalizar a atividade dentro de seus territórios. Três grupos da etnia Kayapó (Mekrãgnoti, Metuktire e Xikrin), representantes dos Munduruku e mais uma delegação de Ye’kwana (que vivem na fronteira com a Venezuela e em território Yanomami) fizeram um encontro durante o acampamento Luta pela Vida, em Brasília, na quinta-feira (26) reunindo lideranças históricas como o cacique Megaron Txucarramãe, uma das primeiras lideranças femininas do povo Kayapó, Kôkôba Mekrãgnotire e o pajé Yanomami, Davi Kopenawa. Assim como jovens lideranças como Alessandra Munduruku, que sofre seguidas ameaças por seu ativismo pelos direitos indígenas, e Mydjere Kayapó, que vem denunciando as crescentes tentativas de aliciamento de lideranças por garimpeiros.
Desde 2019, as promessas de legalização do garimpo defendidas pelo presidente Jair Bolsonaro e as tentativas de regularizar a atividade dentro de Terras Indígenas aliadas à alta do metal no ouro no mercado internacional devido a incertezas com a pandemia, têm impulsionado o crescimento de garimpos dentro e fora de Terras Indígenas (TIs). Nos territórios indígenas, a fiscalização também foi reduzida mesmo antes da pandemia.
“Estamos unidos na luta contra o garimpo e somos a maioria,” disse Mydjere Kayapó, vice-presidente do Instituto Kabu, durante a reunião. Davi Kopenawa lembrou os recentes ataques armados de garimpeiros às aldeias e Alessandra falou sobre a insegurança em que vivem lideranças munduruku. Segundo o Mapbiomas, que usa imagens de satélite e inteligência artificial para analisar a cobertura do solo, 9,3% da áreas de garimpo estão em Terras Indígenas, uma atividade ilícita e que contamina com mercúrio os peixes e a água nas aldeias, provoca desmatamento e degradação. E está intimamente associada a outros ilícitos, como drogas e prostituição, além de facilitar a entrada de bebidas alcoólicas nas aldeias.
De acordo com a carta, assinada por 17 lideranças das quatro etnias, o garimpo “é uma doença que os brancos estão trazendo para dentro dos nossos territórios. Nós não trocamos ouro pela vida de nossos filhos e nossos netos. O garimpo destrói nossa cultura, nossas florestas, envenena nossos rios, cria conflitos entre nossos parentes e acaba com nossos locais sagrados”.
As lideranças exigem no documento que o governo cumpra a ordem do Supremo Tribunal Federal, que em 2020 determinou a retirada dos invasores de TIs através da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 709
Em junho de 2021, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou a retirada dos invasores das terras Yanomami e Munduruku, a pedido da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil e do PSB, acrescentando que a União deveria destacar todo o efetivo necessário para garantir a proteção à vida, da saúde e da segurança das populações indígenas, que corriam riscos de ataques violentos. A decisão ainda não foi cumprida. O aliciamento de uma minoria das lideranças indígenas, que se associam a garimpeiros provoca ainda a cisão e conflitos entre os indígenas.
Nas TIs Baú e Menkragnoti, garimpos desativados foram reabertos nos últimos anos e três aldeias se desligaram do Instituto Kabu em 2019 para se associarem ao garimpo. Não houve operações do Ibama em 2019, apenas uma aconteceu em 2020 e em 2021 houve uma na TI Menkragnoti. Segundo a cacica Kôkôba Mekrãgnotire , fazem muitas luas que não há fiscalização da Funai nas duas Terras Indígenas. “Praticamente uns oito ou nove anos”, calcula Mydjere.